quarta-feira, 25 de abril de 2012

"rebelião..."

Os bichos voltaram!
Trouxeram as cores, os gestos, os ruídos - alfabetos rudimentares.
Mais uma vez conspiram e se rebelam, contidos e confinados ao espaço que lhe reservamos no nosso egoísmo e na nossa soberba. O zoo de cada uma das nossas cidades, o zoo em que transformamos os nossos lugares. O zoo, sítio de confronto e de catarse - arena onde montamos esta farsa tosca.
Contam-nos coisas de onde vieram, terras para onde não mais voltarão, levam-nos aos cheiros que perdemos aos gestos que já esquecemos. Toda a verdade no mais falso dos mundos.
Nós vamos roçando por eles lentamente aos domingos - dia de todos os arrependimentos. E envergonhadamente trajamos a sua dignidade, expiando e purgando a massa fétida das nossas vidas.
E a garra já não vale, o dente não rasga. De nada adianta agora o que vingou a estirpe e a fez vencer o tempo. Possuídos e coleccionados na reserva da nossa consciência, reduto e retiro último da nossa essência e matriz. Eles guardam essa potência mas também a genuinidade para nos lembrar o quanto ainda somos vulneráveis à sedução de qualquer pecado, frágeis e indefesos perante as vontades maiores de qualquer capricho.
Eles carregam e espelham os nossos defeitos, na medida da nossa percepção para os entender.
E por momentos, num trocar cúmplice de olhares, vistamos uma vez mais as suas penas, escamas e pelos; e entre os muros e as redes que confinam os nossos horizontes, nos delimitam as capacidades e nos tolhem as atitudes, saibamos olhar para fora. Saibamos ver para além dos fossos e para lá do ferro das grades. Que num voo amplo e planado, numa corrida solta e graciosa, num grito original, ensaiemos de novo o regresso ao sítio onde nunca estivemos.

Fev.2010
Fernando Gaspar
in cat. Rebelião no zoo – parte II






















rino, acrílico sobre tela, 2010, 100x73cm






















silêncio, acrílico sobre tela, 2010, 100x73cm

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